Almaraz: "Não houve qualquer recuo. Portugal mantém possibilidade de apresentar queixa"

por Rui Sá, João Fernando Ramos

Portugal retira a queixa. Espanha compromete-se a partilhar documentação e a não dar nenhum passo irreversível no que toca ao novo armazém de resíduos nucleares em Almaraz. Bruxelas, que mediou o acordo, congratula-se.
Por cá ambientalistas e todos os partidos, inclusive o PS, levantam duvidas sobre o recuo do governo na queixa apresentada contra Espanha.
"Não entendo as críticas. Não houve qualquer recuo. Com este acordo Portugal mantém a possibilidade de apresentar queixa daqui a dois meses", afirma no Jornal 2 o ministro dos Negócios Estrangeiros, que garante o país "não desistiu de qualquer dos seus direitos" nesta matéria.

Augusto Santos Silva garante o país fica a ganhar com o acordo agora alcançado. "até ao momento tínhamos uma queixa, mas não tínhamos, nem acesso ao local, nem a qualquer documentação".

Com o acordo agora alcançado, nos dois próximos meses vão acontecer visitas técnicas ao local de construção do armazém de resíduos, e Portugal passa a poder analisar todos os estudos efetuados por Madrid para licenciar aquela instalação.

"Espanha comprometeu-se a ver se há impactos significativos no território português", diz Augusto Santos Silva que insiste em deixar claro que se o resultado não for satisfatório, quer do ponto de vista dos impactos ambientais em Portugal, quer do ponto de vista da segurança daquela instalação, Portugal reapresentará a queixa que agora suspendeu.

A construção do armazém de 25 milhões de euros já teve inicio. Espanha compromete-se no entanto a não tomar nenhuma decisão irreversível. As obras de construção civil não estão nesta categoria.


Partidos e ambientalistas criticam retirada da queixa


Para as diversas organizações ambientalistas ouvidas pela RTP (Quercus, Zero, Movimento Cívico Tejo Seguro) o acordo agora celebrado não e satisfatório já que não garante o embargo do projeto nem dá qualquer garantia ao país de que os reclamados estudos de impacto em Portugal serão feitos de acordo com o que ditam as normas de segurança nuclear europeias,

O ministro do ambiente deixou esta terça-feira claro no parlamento que eles podem não acontecer da forma que estão previstos, mas que o país vai ficar a conhecer os impactos e que estes serão submetidos não apenas a uma análise técnica, mas a uma consulta pública em Portugal.

Criticas ao acordo chegam também literalmente de todos os partidos. Na maioria que apoia o governo aponta-se o dedo a António Costa que assinou entendimento mediado por Jean-Claude Junker com Madrid.

A decisão não caiu bem, nem no próprio Partido Socialista com a deputada Maria da Luz Rosinha a deixar claro que também ela não concorda com a retirada da queixa em Bruxelas apesar de estar de acordo que o país deve agarrar todas as oportunidades que permitam defender os seus interesses nesta questão.

Para o PSD o acordo nesta matéria serve apenas para "atirar areia para os olhos". O CDS garante que "é um passo em frente para o abismo".


Marcelo apela ao PSD para cooperar falando com Rajoy


Marcelo Rebelo de Sousa considera este acordo como "uma espécie de pré acordo" e insta os partidos a não criticar mas antes usar as suas relações com os governantes do país vizinho "para que se transforme este pré-acordo num acordo duradouro".

O presidente da República apela também para que o PSOE espanhol tenha a mesma atitude com o governo de Lisboa.

"Ambos os países têm a ganhar com um entendimento nesta matéria", afirma.


Prolongamento do ciclo de vida de Almaraz


Os dois reatores de Almaraz têm licença de funcionamento até 2020. A capacidade atual de armazenamento de resíduos radioativos esgota-se um ano depois. Todos os grupos ambientalistas alertam para o facto de que a construção do armazém ser um primeiro passo para prolongar o ciclo de vida de uma central com quase 40 anos de vida e que deveria ter sido encerrada há já uma década.

"Não estamos ainda a conversar com Espanha sobre um eventual prolongamento da vida útil da central. Essa questão não foi ainda oficialmente colocada pelas autoridades espanholas, mas Portugal terá que ser ouvido nessa questão", diz o ministro dos negócios estrangeiros que considera que a abertura ao diálogo que agora se estabelece para discutir o armazém de resíduos abre canais de comunicação que serão fundamentais também nessa segunda fase do problema.

Um armazém para tratamento do combustível nuclear, que pode estar ativo por mais de 300 anos, é no entanto tão necessário de num cenário de prolongamento da licença como de desmantelamento da central.

Segundo contas da própria Comissão Europeia, e dependendo da técnica usada, desativar uma central como a de Almaraz pode custar mais de cinco mil milhões de euros e demorar até 60 anos a estar concluída.


Angola adia visita de Francisca Van Dunnen a Luanda


Sobre o adiamento, a pedido das autoridades de Luanda, da visita da Ministra da Justiça a Angola, o responsável máximo pela diplomacia portuguesa garante que "através dos canais diplomáticos será estudado o eventual reagendamento dessa visita".

Augusto Santos Silva afirma que o governo português mantém todo o empenho em trabalhar "no sentido de reforçar as relações políticas, diplomáticas, e económicas com Angola".

Neste âmbito foi decidida uma deslocação de António Costa àquele país. O ministro dos negócios estrangeiros deixa claro que esta deslocação do primeiro-ministro vai mesmo acontecer. Augusto Santos Silva esteve à duas semanas em Luanda para preparar essa mesma visita. "Foram avançadas diversas datas. Acordamos que ela se deveria efetuar o mais breve possível", diz o responsável pela diplomacia portuguesa que acrescenta que "para nós só fazem sentido deslocações que sejam úteis e neste momento o que faz sentido é essa deslocação do Primeiro-ministro da Luanda".
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